Tadeu Mathias revisita estilos como Forró depois de histórias com Cults da MPB e o domínio estético da voz afinada
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Por Walter Santos
Se reparar direito, a cena musical e artística do Nordeste para dentro e fora dos nove estados não para de apresentar e/ou produzir artistas de relevo nos vários níveis, como é o caso do cantor, compositor e professor de canto, Tadeu Matias que, nesta entrevista, expõe uma rica trajetória e ainda de sonhos avaliando também a cena nacional mercadológica ou não. Leiamos:
Revista NORDESTE – Até onde a vista alcança, seu tempo tem sido ocupado entre João Pessoa e Rio de Janeiro. O que essas duas bases geográficas significam na sua vida e história?
TADEU MATHIAS – Saí da Paraíba em abril de 1979 com dois parceiros, Ivan Santos (cantor e compositor) e Firmino (percussionista). Montamos um show e fomos à luta. Eu já sabia que queria chegar ao Rio, desde o início de 1978, quando a convite de Elba Ramalho (que eu já conhecia) – ela foi pro Rio em 1974 e nessa época, voltando à Paraíba, me escolheu para ser seu parceiro no show Baião de dois, em que minha tarefa era substituir o grande Geraldo Azevedo, em duas praças (João Pessoa e Caruaru) que ele não poderia fazer os shows com ela. Aí se deu o início da minha carreira que já era um sonho a ser realizado.
Histórias a serem lembradas
NORDESTE – E os desdobramentos?
TADEU MATHIAS – No Rio, conquistei reconhecimento do meio musical; e embora minha carreira solo não ter deslanchado por causa da quantidade de nordestinos que já havia nas grandes gravadoras. Diante disto, fui trabalhar como vocalista. Naquele mercado promissor, gravei com grandes produtores, como Marcos Mazzola, Robertinho de Recife, Jorge Cardoso e Renato Corrêa. Fiz dublagem de voz cantada em desenhos animados para os canais Sony e Warner Channel, assim como back na banda da Elba, no Brasil e exterior. Esse mercado foi ficando pequeno depois na era digital.
NORDESTE – E os vínculos, a ancestralidade…
TADEU MATHIAS – Parahyba (essa pra mim, é a grafia que me agrada) é minha terra, aonde tenho minhas raízes, meu vasto conhecimento musical, minha ancestralidade. Estou aqui para vivenciar uma intimidade familiar que ficará pra trás, saí de casa entre meus 17/18 anos. Reconecto aqui, as minhas origens, isso tem um peso, uma profundidade, um significado.
Diversidade de estilos
NORDESTE – Você convive com a performance de intérprete de vários estilos mas, ultimamente, tem abrigado o forró. Por que a escolha?
TADEU MATHIAS – Por quanto agrega à minha musicalidade mais original e espontânea, caseira (embora também, muito diversa). Minha mãe tinha parentes distantes que eram contadores violeiros, por isso ela ouvia todos os dias o programa Retalhos do sertão, o que nós trazia esse conhecimento da cultura da terra.
Também fiz parte do grupo folclórico de Campina Grande, aonde cantava, dançava e encenava textos regionais, folhetos de cordel e o meu ápice nesse grupo, foi minha interpretação de Zé Limeira, o poeta do absurdo, quando num dos costumeiros festivais de geniais violeiros, depois de me apresentar aos 16 anos, a caráter, como o poeta, fui saudado por cada um dos mais de 40 participantes do festival. Estavam lá Ivanildo Vila Nova, Otacílio Batista, Oliveira de Panelas, entre tantos. Experiências que moram dentro de mim e têm valor inestimável.
Mitos e ídolos
NORDESTE – A história lhe apresenta desde o final dos anos 70 na MPB em torno de Elba Ramalho, por exemplo, até conviver com seu próprio LP (Long Play) até chegar aos tempos atuais. Qual sua identidade diante de tantos mitos?
TADEU MATHIAS – Nunca consegui parecer com ninguém. Sou um artista personalíssimo. Minha voz é única e não conseguiria parecer com ninguém. Acima falei das influências da minha mãe, com seu gosto pela cultura local e não obstante meu pai contratar embaladores de coco para festas familiares, minha mãe também gostava de Frank Sinatra e dos cantores americanos, que faziam sucesso na tv e no rádio, àquela época. Portanto, influências muito variadas.
NORDESTE – Sua exímia condição de intérprete lhe levou a ser especialista preferido no canto vocal de nomes como Elba e Geraldinho Azevedo. Você é mesmo professor do que mesmo?
TADEU MATHIAS – Sou formado bacharel em canto pelo Conservatório Brasileiro de Música do Rio de Janeiro. Estudei nove anos com duas respeitadas professoras, uma carioca e outra mineira, Maria Helena Bezzi e Patrícia Peres, canto erudito, que aproveitei este aprendizado adaptando a técnica para meu canto desde sempre popular. Dei aulas no Conservatório, mesmo antes de obter o diploma, pelo crédito de Dona Marina Lourenço Fernandes (filha do grande autor erudito brasileiro) e Dona Cecília Conde, da renomada família carioca.
O instrutor vocal
NORDESTE -Como definir sua fase de instrutor vocal, por exemplo, do então Programa do Faustão, na Rede Globo. Qual o saldo de tudo isso?
TADEU MATHIAS – Sou trabalhador. Durante o final dos anos 90 até 2015, mantive uma clientela vasta, em que dei aulas para pessoas importantes no meio musical, como o cantor e produtor Zé Henrique da banda Yahoo, para a filha de Connie Lopes (ex-diretora da Warner Music) que impressiona com seu canto popular, vigoroso, inspirado, a cantora Natasha Llerena, Tânia Mara (ex- mulher de Jaime Monjardim) e mais uma gama de iniciantes.
Também dei aulas de técnica vocal prá Elba, seu filho Luã, há 14 anos sou a pessoa que cuida da voz de Geraldo Azevedo (também dei aulas prá três de seus filhos). Com isso, meu nome chegou à globo, com diversas recomendações. Trabalhei no Faustão em 2013, 2014 e 2015; no último programa que participei, Os Iluminados (era um programa para grandes vozes, em que sete cantores – homens e mulheres, tinham que cantar a mesma música no mesmo tom, sem saber qual parte pegariam na hora, porque só descobriam a parte que lhes cabia, na hora por sorteio). Foi um desafio em que um dos meus pupilos ficou em segundo lugar, perdendo apenas para um candidato que se adequava mais ao mercado.
Memórias
NORDESTE – Os dados provam que nascido em Campina Grande sua trajetória se consolidou entre João Pessoa e Rio. Quais as personalidades e memórias advindas de Campina? Braulio Tavares?
TADEU MATHIAS – Como já falei, os contadores de violão, os embaladores de coco, Bráulio Tavares – meu parceiro musical e de palcos, Elizabeth Marinheiro – professora e grande diretora de teatro, Ednalva Macena – discípula de Betinha marinheiro e minha diretora no grupo folclórico, Biliu de Campina, Capilé, Marinês, Seu Vavá, as ceguinhas cantadoras de embolada, Umbelino Brasil (por tanto tempo diretor do museu de arte) Lanka – meu ex – cunhado e talentoso instrumentista e luthier de pandeiros.
Projetos futuros
NORDESTE – Quais os projetos no seu foco nos tempos atuais? Como anda sua relação com as figuras notáveis da música Paraíba e brasileira?
TADEU MATHIAS – Tenho ainda muitos sonhos e projetos, mas tenho hiper foco, o que me deixa estressado se fizer muita coisa ao mesmo tempo, também não sou a pessoa mais organizada do mundo, portanto, levo tempo pra realizar as coisas. Ao mesmo tempo, dou muito valor às coisas feitas com um certo grau de humanidade, sem pensar o interesse empresarial, meramente mercadológico. Quero trabalhar sempre com prazer. Acho que essa é a fonte da minha fonte de juventude. Sou animado, alegre e jovem. (Ehehehe)
NORDESTE – Por fim, qual sua leitura da MPB diante de tantos estilos – alguns deles difíceis de ouvir?
TADEU MATHIAS – Não sou muito político. Entendo como as coisas do mercado funcionam, mas não quero uma carreira em que tenha que fazer muitas concessões. Num daqueles programas do Faustão, um candidato gostou de uma música minha e seu produtor mandou dizer que se eu trocasse o nome da minha música Sanfona Companheira para Viola Companheira e lhe desse a parceria, ele estouraria a música em todo o Brasil. Mesmo sabendo que ele tinha poder e capital para cumprir a proposta, tasquei – lhe um não como resposta. Não sei fazer esse tipo de negociata. Mas quero trabalhar, gravar álbuns e fazer shows, porque desconheço lugar melhor que o palco.