Axé 40 anos: da explosão cultural à busca pela renovação

Ritmo que transformou a música baiana chega às quatro décadas com legado consolidado, mas enfrenta desafios para manter sua identidade e espaço no mercado

 

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Por Luciana Leão

 

 

O axé completa 40 anos em 2025, consolidando-se como um dos maiores fenômenos da música baiana e brasileira. Nascido nos anos 1980 da fusão de ritmos afro-baianos como samba-reggae e ijexá — um frevo eletrizante de origem nigeriana — com influências caribenhas e do pop, o gênero revolucionou o Carnaval da Bahia e conquistou o Brasil.

 

A palavra “axé”, de origem iorubá, significa energia, poder e força. Para as nações afro-brasileiras, é usada como saudação para desejar boas energias. Nos terreiros de candomblé e umbanda, a musicalidade sempre esteve presente, e foi dessa base cultural que surgiu o axé music.

 

O termo, no entanto, foi inicialmente empregado de forma pejorativa pela mídia para criticar a “comercialização” da música baiana. O movimento ganhou força com a popularização da música É d’Oxum, de Gerônimo, em 1985.

 

O “Pai do Axé”

 

 

No entanto, o grande precursor do ritmo foi Luiz Caldas, considerado o “Pai do Axé”. Multi-instrumentista e compositor de centenas de músicas, Caldas se destacou com sucessos como Magia, Visão do Cíclope, É Tão Bom, Mademoiselle, Haja Amor, Fricote e Tiêta. Seu legado é extenso: são mais de 818 composições registradas na União Brasileira dos Compositores (UBC) e 276 gravações catalogadas no Ecad.

 

Por sua contribuição à música brasileira e aos 40 anos do axé music consolidados dentro e fora do País, Caldas foi homenageado recentemente pela UBC com a Medalha UBC, reconhecimento já concedido a nomes como Fausto Nilo.

 

Caldas recebeu homenagem recente da UBC pela sua contribuição à música brasileira. Foto: Divulgação UBC

Em entrevista, o compositor se disse honrado pelo reconhecimento: “É uma honra! O primeiro a receber essa honraria foi Fausto Nilo e é uma responsabilidade muito grande! O Fausto é um poeta maravilhoso, que contribuiu e contribui demais com a nossa obra, com a música brasileira. E poder estar nesse lugar agora, rodeado de ídolos, de pessoas que eu amo e me respeitam musicalmente, isso pra mim é a realização de um sonho!”,celebrou Luiz Caldas.

 

 

A explosão do axé e seus ícones

 

Timbalada, com Carlinhos Brown

 

Chiclete com Banana, com Bell Marques

 

 

A trajetória do axé foi impulsionada por bandas e artistas que deram identidade ao ritmo. Chiclete com Banana, Banda Beijo (com Netinho) e Banda Eva foram fundamentais no início do movimento. Paralelamente, os blocos afro de rua como Olodum, Timbalada (criado por Carlinhos Brown), Ara Ketu e Ilê Aiyê trouxeram uma percussão marcante e letras voltadas para a valorização da cultura afro-brasileira, com conscientização racial, influenciando o axé.

 

 

Daniela Mercury, considerada uma das musas do Axé. Foto: Lucas Moura/PMS

 

Nos anos 1990, o axé dominou as rádios e o Carnaval, com trios elétricos atraindo milhões. Daniela Mercury se tornou a “rainha do axé” com sucessos como Swing da Cor e O Canto da Cidade, enquanto Ivete Sangalo se consolidou como a maior estrela do ritmo musical, com hits como Festa e Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim. A atual ministra da Cultura, Margareth Menezes, também se destacou com sua voz marcante e músicas como Me Abraça e Me Beija.

 

O axé sempre flertou com outros estilos musicais. A Banda Eva e o grupo É o Tchan!, por exemplo, ajudaram a incorporar elementos do pop, eletrônico e até do rock ao ritmo. No entanto, o crescimento da indústria musical trouxe desafios para o ritmo.

 

 

Desafios e

transformações

 

Mas, como nem tudo são flores, com o passar dos anos, o axé enfrentou dificuldades para manter sua relevância. Nos anos 2000, passou a disputar espaço com o funk, o sertanejo universitário e o pagode.

 

Além disso, foi criticado por se distanciar de suas raízes afro-baianas, tornando-se cada vez mais industrializado. Letras com apelo sexual excessivo também geraram polêmica, especialmente em músicas que remetiam ao machismo, neste caso, com o grupo É o Tchan.

 

Os altos custos para manter trios elétricos e bandas, a concorrência com eventos privados no Carnaval e a falta de reconhecimento aos ícones pioneiros são questões que ainda pesam sobre o ritmo. Blocos de pipoca — onde foliões podem curtir a festa sem pagar abadá — se tornaram uma alternativa, mas mudaram a dinâmica do Carnaval baiano.

 

Busca pela essência

 

 

Apesar das dificuldades, o axé segue vivo. Artistas como Ivete Sangalo, Bell Marques (ex-Chiclete com Banana) e Saulo Fernandes (ex-Banda Eva) continuam levando o ritmo para grandes públicos, mantendo a essência do ritmo baiano.

 

Enquanto isso, novos nomes como Léo Santana e Xanddy Harmonia misturam o axé com o funk, criando uma sonoridade mais moderna. Bandas como Vingadora e Psirico adicionaram influências do brega e outros estilos urbanos ao som do axé.

 

A nostalgia do axé das antigas também motiva iniciativas de resgate do ritmo afro-baiano. Projetos como Axé 40 anos buscam revitalizá-lo com reedições e shows históricos, a exemplo do Festival de Salvador.

 

Ainda assim, há divergências sobre os rumos do axé. Netinho, um dos ícones do movimento, assim como Luiz Caldas, recentemente criticou pelas redes sociais a cena musical atual do Carnaval baiano:

 

Netinho diz que o Carnaval baiano está “infestado” por músicas estranhas. Foto: Arquivo pessoal

Minha música tão amorosa e positiva não cabe mais na festa, que está infestada por músicas estranhas”, disse o cantor, que passou a se apresentar fora de Salvador durante a folia. Mesmo diante de desafios, o axé chega aos 40 anos consolidado como parte fundamental da identidade cultural afro-brasileira. Seu impacto na música e no Carnaval é inegável, e seu futuro ainda está em construção.

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Luciana Leão

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