Com a regulamentação do Mercado de Carbono pela Lei 15.042/2024, o setor pode atingir US$ 50 bilhões até 2030. A Fazenda Sete Ranchos aposta na certificação de créditos de carbono para preservar 50% de sua área como Floresta Amazônica nativa, inserindo-se em um mercado onde o Brasil tem 15% do potencial global de captura e pode suprir quase metade da demanda mundial
Matéria publicada na edição 218 da revista NORDESTE. Leia abaixo ou acesse pelo APP aqui
Por Luciana Leão

O mercado de carbono no Brasil ganhou um novo impulso com a sanção da Lei 15.042/2024, que regulamenta a comercialização de créditos de carbono e estabelece o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissão de Gases de Efeito Estufa (SBCE).
Segundo estudo da consultoria McKinsey, esse setor pode atingir um valor de US$ 50 bilhões até 2030, com o Brasil desempenhando um papel estratégico. O país possui 15% do potencial global de captura de carbono por meios naturais e pode suprir até 48,7% da demanda mundial, tornando-se um dos principais fornecedores de créditos de carbono.
Essa regulamentação representa uma oportunidade para o agronegócio brasileiro, incentivando a inovação tecnológica e a preservação ambiental. No coração desse movimento, produtores rurais estão aderindo ao mercado de carbono, transformando áreas preservadas em ativos financeiros.
Um exemplo dessa mudança vem do município de São José do Xingu, no Mato Grosso, onde o pernambucano Carlos Eduardo Souto, proprietário da Fazenda Sete Ranchos, ingressou recentemente no Mercado Voluntário de Carbono.
Créditos de carbono: da teoria à prática no campo
Os créditos de carbono funcionam como um mecanismo que recompensa iniciativas de redução de emissões de gases de efeito estufa. Empresas que emitem menos gases do que o limite permitido podem vender esses créditos para outras que ainda precisam compensar suas emissões.
Na prática, isso incentiva soluções sustentáveis, como a preservação florestal, o reflorestamento e o uso de tecnologias limpas. No Brasil, onde o desmatamento ainda é um desafio grande, o mercado de carbono surge como uma ferramenta essencial para valorizar economicamente a floresta em pé e estimular práticas mais sustentáveis.

Foi essa possibilidade que levou Carlos Eduardo Souto a aderir ao modelo. Sua fazenda, localizada dentro da região amazônica, manteve 50% de sua área total como floresta nativa, o que possibilitou o sequestro significativo de CO₂ da atmosfera.
“Fizemos um levantamento da quantidade de carbono capturada pela vegetação da fazenda e agora podemos vender esses créditos para empresas que precisam compensar suas emissões. A comercialização desses créditos não só nos traz uma nova fonte de renda, mas também incentiva a preservação da floresta”, explica o produtor. “Funciona como uma terceira safra agrícola”, completa o produtor, já que no mercado atual 1 tonelada de crédito de carbono está em média cotada a U$ 12,00 .
O cálculo da captura de carbono na Fazenda Sete Ranchos foi realizado pela empresa Greenline, utilizando tecnologia baseada em imagens de satélite. Já a certificação foi feita pelo Bureau Veritas, uma das principais referências mundiais na validação de créditos de carbono. Os créditos gerados são registrados na plataforma Waves, garantindo transparência e segurança na negociação.
Desafios e perspectivas para os produtores rurais
Apesar das oportunidades, Souto destaca que a entrada no mercado de carbono ainda é um desafio para muitos produtores. Um dos principais obstáculos é encontrar empresas confiáveis para realizar a certificação e a intermediação da venda dos créditos.
“O mercado ainda está cheio de aventureiros. Muitas empresas cobram valores altos para fazer o projeto, sem garantia de que os créditos serão realmente gerados. No nosso caso, fechamos com a Greenline, que assumiu os custos iniciais em troca de uma porcentagem dos créditos”, conta à reportagem da Revista NORDESTE.
Outro desafio é a falta de informação sobre o funcionamento do mercado e o potencial dos créditos de carbono. A regulamentação trouxe mais segurança jurídica, mas ainda há um longo caminho para que produtores e empresas conheçam as possibilidades desse setor.

Mesmo assim, a Fazenda Sete Ranchos já obteve resultados concretos. Em 2023, gerou 86.000 toneladas de créditos de CO₂, e a projeção para 2024 deve seguir nessa mesma faixa, dependendo de fatores como incêndios e recuperação de áreas de preservação permanente.
Além disso, Souto acredita que, à medida que mais produtores aderirem ao modelo, o impacto ambiental será ainda maior. Vizinho ao seu terreno, outro produtor já manifestou interesse em ingressar no mercado de carbono.
A tecnologia como aliada da preservação

O modelo adotado na Fazenda Sete Ranchos exemplifica como a tecnologia pode ser aliada da sustentabilidade. O método utilizado pela Greenline permite mapear digitalmente a propriedade e calcular com precisão a captura de carbono, tornando o processo mais eficiente e acessível.
O registro dos créditos na plataforma Waves garante que cada crédito seja único e rastreável, evitando fraudes e dando mais segurança aos investidores e compradores. Esse sistema funciona como um mercado financeiro, onde os créditos podem ser negociados como ativos digitais, proporcionando maior transparência nas transações.
A certificação pelo Bureau Veritas também agrega credibilidade ao processo. Como uma das principais entidades globais de validação de créditos de carbono, a instituição assegura que os créditos gerados realmente correspondem a reduções efetivas de emissões de CO₂.
“O Bureau Veritas chancela que os créditos são legítimos, o que facilita a venda para compradores internacionais e aumenta a confiança no mercado”, explica Souto.
O futuro do mercado de carbono no Brasil
Com a regulamentação do mercado de carbono, a expectativa é que mais produtores rurais adotem esse modelo, transformando áreas preservadas em ativos rentáveis. Souto acredita que o governo poderia incentivar essa transição, adquirindo créditos de carbono para compensar as emissões das grandes cidades.
“Se houvesse uma política nacional de compra de créditos, financiada por empresas e até por motoristas de veículos, por exemplo, que emitem CO₂ diariamente, isso criaria uma grande demanda e traria mais recursos para a preservação ambiental”, sugere.
A Lei 15.042/2024 prevê um prazo de dois anos para que as empresas se adequem às novas regras, o que deve acelerar a procura por créditos de carbono nos próximos anos. A Fazenda Sete Ranchos já está preparada para esse cenário, com um modelo inovador que alia preservação e desenvolvimento econômico.
O Brasil, com sua vasta cobertura vegetal e potencial para captura de carbono, tem a chance de se tornar um líder global nesse mercado – e experiências como a de Carlos Eduardo Souto mostram que essa oportunidade já está sendo aproveitada.