Por Inez Mustafa*
“A questão de um trilhão de dólares é saber como e onde mobilizar recursos para o financiamento climático”, afirma Mikko Ollikainen, chefe do Fundo de Adaptação. O financiamento climático é um tema recorrente das negociações internacionais sobre mudança do clima, especialmente nas Conferências das Partes (COPs) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês).
Sob o princípio das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”, o Acordo de Paris reconhece que países desenvolvidos devem liderar os esforços e apoiar financeiramente nações em desenvolvimento; mas Ollikainen alerta que os recursos do setor público são limitados.
A necessidade de financiamento climático é um dos assuntos tratados pelo Acordo de Paris, adotado em 2015, na COP21. Ele é essencial para apoiar países em desenvolvimento na implementação de ações de mitigação (redução de emissões de gases de efeito estufa) e adaptação (preparação para os impactos da mudança do clima).
Antes desse acordo, em 2009, países desenvolvidos já haviam se comprometido a mobilizar 100 bilhões por ano até 2020 para financiamento climático; mas o dinheiro prometido nunca chegou realmente, afirma Avinash Persaud, assessor especial para mudanças do clima do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Na COP29, as nações concordaram a destinar ao menos 300 bilhões de dólares por ano até 2035 para ações climáticas nos países em desenvolvimento. A decisão também convoca todos os atores a trabalharem para mobilizar 1,3 trilhão de dólares em financiamento climático, e determina que Azerbaijão e Brasil, como presidentes da COP29 e da COP30, apresentem em Belém um documento com caminhos para a mobilização dos 1,3 trilhão de dólares.
“Essa quantia é mais próxima do valor que os países em desenvolvimento realmente precisam”, adiciona Richard Muyungi, enviado para o clima e conselheiro do presidente da Tanzânia para o Ambiente e a Mudança do Clima.
Muyungi reforça, por exemplo, que iniciativas como a Grande Muralha Verde, que visa combater o avanço do deserto do Saara, dependem desse tipo de financiamento para garantir a proteção do continente africano. “Precisamos de mais apoio financeiro, tecnologias inovadoras e o envolvimento das comunidades locais para que projetos como esse sejam sustentáveis e eficazes”, destaca Muyungi.
Bancos Multilaterais de Desenvolvimento
“Cerca da metade do financiamento climático que flui dos países desenvolvidos para os em desenvolvimento provém do sistema de Bancos Multilaterais de Desenvolvimento (MDBs, sigla em inglês), dos quais os países desenvolvidos tendem a ser os principais acionistas”, disse Avinash Persaud.
Mas nem todos os acionistas são países desenvolvidos, acrescenta o assessor. Países em desenvolvimento, como o Brasil, são importantes acionistas nos MDBs, como o BID, o Banco Mundial e o Novo Banco de Desenvolvimento (Banco do BRICS).
Na COP29, os MDBs comprometeram-se a fornecer 120 bilhões de dólares em financiamento climático para países de baixa e média renda até 2030, aproximadamente o dobro do financiamento em 2022. Persaud alerta que é imprescindível triplicar esse montante. Para isso, é necessário que acionistas invistam mais capital e os governos doadores ofereçam as suas garantias, reitera.
Fundos Climáticos Multilaterais
Há também fundos climáticos multilaterais, como o Fundo Verde Para o Clima, o Fundo de Adaptação e o Fundo de Perdas e Danos. Para Miko Ollikainen, “acessar os fundos diretamente é permitir que os países aprendam e desenvolvam suas capacidades, para enfrentar a mudança do clima”.
Segundo o chefe do Fundo de Adaptação, “não só precisamos desenvolver essa capacidade no âmbito federal, mas também municipal, pois é necessário levar essas capacidades até às comunidades, que precisam aprender a viver com essa situação que não causaram”. Ele enfatiza a importância do apoio aos grupos sociais que enfrentam diretamente a mudança do clima para que possam desenvolver suas capacidades a longo prazo.
A participação brasileira nos fundos climáticos é significativa, tanto como receptor de recursos quanto como contribuinte. No Fundo Global para o Meio Ambiente, além de ser contribuidor financeiro, o Brasil tem acesso a recursos para projetos relacionados à biodiversidade, desertificação e poluição. Desde 2022, foram aprovados 26 projetos no país, com financiamento de 797 milhões de dólares.
Financiamento Privado
Patricia Espinosa, ex-secretária executiva da UNFCCC, afirma ser necessário diversificar as fontes de financiamento e olhar para os recursos privados.
“Temos de olhar para a agenda da sustentabilidade, como uma agenda para a competitividade, para o bem-estar das pessoas, para o bem-estar de toda a sociedade”, acrescenta a diplomata mexicana. Ela destaca que o setor privado é um dos “motores da economia”.
Para aumentar essa participação de ativos, Espinosa acrescenta que os governos precisam promover regulamentos nacionais que deem incentivos fiscais para a participação do financiamento privado em projetos de adaptação e mitigação climática.
Além disso, afirma ser importante engajar as comunidades nesse processo, ao pensar em projetos que possam ser de interesse para o setor privado. “É preciso levar em conta o custo da inação, pois esse aspecto ainda não está completamente integrado na avaliação de risco”, conclui Espinosa.
*Equipe de Conteúdo da COP30